Futebol

17 janeiro 2018, 16h14

Wando

Wando representou o Benfica durante quatro épocas (1984 a 1988)

O primeiro de 14 jogos entre o Benfica e o Chaves no Estádio da Luz, na história do Campeonato Nacional, foi vivido e discutido a 15 de março de 1986. Na antiga Catedral, as águias impuseram-se por 4-0, com os golos a serem anotados por Rui Águas (3) e Manniche.

A esquerda do meio-campo do Benfica, sector que incluía nomes como Diamantino, Carlos Manuel e Shéu, ficou por conta de Wando, o brasileiro que fora contratado no verão de 1984 para ajudar a preencher o vazio criado pela partida de Fernando Chalana para o Bordéus.

Em entrevista ao Site Oficial, Geovânio Bonfim Sobrinho, ou simplesmente Wando, como ficou conhecido nos relvados e entre os amigos e familiares, regressa ao tempo em que concretizou uma das suas ambições. "Hoje e sempre, o sonho de qualquer um é jogar no Benfica. Eu realizei o meu sonho", enfatiza, orgulhoso, o antigo extremo, que usou o Manto Sagrado durante quatro épocas (1984-88), tendo participado em 140 jogos e marcado 23 golos.

Wando lança também um olhar sobre o presente da equipa do Benfica, que é já o desafio com os flavienses, às 18h15 de sábado, no Estádio da Luz. Os bilhetes para o desafio da 19.ª jornada da Liga NOS estão à venda.

Bilhetes Jogo Benfica Chaves

Disputou o último de 140 jogos pelo Benfica a 10 de junho de 1988, há quase 30 anos. São muitas as saudades do tempo em que vestia o Manto Sagrado?

Muitas, muitas saudades mesmo… Através do Facebook, tenho vindo a resgatar muitos amigos: o Manniche, o Mats Magnusson… Toda a gente me adiciona como amigo e nesses momentos então a saudade é ainda maior, porque o nosso grupo era muito unido, era uma família. O Samuel… Lembra-se do Samuel?

Sim, defesa-central, muito veloz…

Isso… O Samuel esteve comigo aqui em Brasília, a passar férias. Mais um grande amigo que fiz no grande Benfica. Éramos uma equipa vencedora. Tivemos muitas alegrias.

Wando

"'Vai, Veloso, vai!' Eu não queria era bater o penálti... Morria de medo"

Além do percurso que teve no Clube, o Wando será sempre recordado e imortalizado nos livros por causa de Fernando Chalana, visto que se transferiu do Braga para o Benfica com o objetivo de render o Pequeno Genial, que ingressara no Bordéus…

Substituir o Chalana não era brincadeira. Eu estava há pouco tempo em Portugal, sabia que o Chalana era um ídolo nacional, mas não tinha noção da dimensão da responsabilidade de o substituir no Benfica. O primeiro ano foi muito difícil para mim. Tive de usar toda a minha força mental e a minha família apoiou-me bastante. O treinador, Pal Csernai, também me incentivava bastante, dava-me moral, dizia-me para eu não baixar a cabeça.

Na segunda temporada foi-se o sofrimento e as coisas começaram a andar normalmente. Nesse ano o treinador era o inglês John Mortimore e ele deu-me um grande impulso. Estava a sempre a dizer-me: "Wando, tira defesa, tira defesa." Era o que eu sabia fazer: driblar o meu adversário, ir à linha de fundo e cruzar. Aquilo foi-me dando moral e consegui reverter toda a situação.

Ganhou uma Taça de Portugal no primeiro ano, outra Taça e uma Supertaça no segundo ano, no terceiro foi Campeonato e Taça e no quarto a Taça dos Campeões Europeus escapou no desempate por penáltis. Essa final de Estugarda, diante do PSV Eindhoven, ficou-lhe atravessada até hoje?

Ficou atravessada, ficou. Vou contar uma história desse jogo. Faltavam três jogadores nossos bater penáltis: eu, o Álvaro e o Veloso. Todos morrendo de medo de bater! Era uma responsabilidade muito grande.

Estávamos sentados e o Veloso falou: "Eu vou lá, dou uma paradinha, o guarda-redes vai para um canto e eu chuto para o outro." E eu disse: "Vai, Veloso, vai! Eu não queria era bater! Vai, Veloso…" O Álvaro fez coro: "Vai, Veloso, vai!" E o Veloso foi: fez uma paradinha, mas o guarda-redes não se mexeu; ele chutou e o Van Breukelen defendeu a bola. Mas a gente tinha de ter ganhado o jogo nos 120 minutos…

E o Wando até teve o golo da vitória à mercê do seu pé esquerdo…

Pois foi, eu tive uma oportunidade, bati cruzado, mas não resultou. Podia ter tentado chutar direto à baliza, mas o ângulo estava um pouco reduzido. A minha ideia era que a bola tabelasse em alguém e entrasse. Mas foi um jogo bom, jogámos de igual para igual, não nos amedrontámos, dignificámos o nome do Benfica na Europa.

Se tivéssemos vencido esse jogo, teria fechado com a chave de ouro o meu período de quatro anos no Clube. Mas foram momentos maravilhosos, fantásticos. Praticamente só tive alegrias no Benfica. Não posso reclamar de nada.

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"O taxista levou-me à Luz e ficou doido comigo. Eu acho que era sportinguista..."

Representou o Braga antes de colar a camisola do Benfica ao seu corpo. Ainda tem bem presente na memória o dia em que baixou no mapa de Portugal para ser apresentado na Luz?

Lembro, sim, perfeitamente. Tenho a maior consideração pelo Braga, foi o clube que me abriu as portas em Portugal, mas jogar no Benfica é o sonho de qualquer jogador e eu realizei esse sonho. O dia em que cheguei ao velho Estádio da Luz foi uma emoção total, uma satisfação imensa. Hoje, fico imaginando esses jogadores fazendo o que eu fiz, entrando no estádio… E aí volta tudo aquilo o que eu vivi.

Conte-nos como foi…

Olhe, tenho uma história curiosa. Quando me fui apresentar, cheguei ao aeroporto de Lisboa e apanhei um táxi. O aeroporto fica próximo do Estádio da Luz… Quando eu disse que era para lá que queria ir, o taxista ficou fulo comigo. Eu acho que ele era sportinguista. Resmungou, ficou doido comigo. Foi engraçado.

Depois, quando cheguei ao destino, havia um batalhão de jornalistas à porta. Logo ali eu senti: estou num clube grande. Muita gente à espera, muitos jornalistas… Foi o dia da apresentação do plantel e eu era a novidade. Foi maravilhoso. O Braga fez tudo para evitar que eu fosse para o Benfica, mas eu tinha esse sonho, fui pelo coração.

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"O leite das crianças estava em jogo, eu queria era ganhar"

Os reencontros com o Braga dentro de campo foram duros?

Meu irmão, aí é o leite das crianças que está em jogo! Eu queria era ganhar. Tem de ser profissional, defender com unhas e dentes a equipa que nos paga o salário.

Qual foi o golo mais valioso que apontou pelo Benfica?

Recordo-me de dois marcados ao Sporting num 5-0 no Estádio da Luz, para a Taça de Portugal. Foram os golos mais valiosos da minha vida. Foi um prazer enorme dar uma alegria grande aos sócios e adeptos do Benfica naquele jogo.

Tinha queda para marcar golos ao rival…

Eu gostava de fazer golos contra o Sporting, Deus ajudava-me muito. Era bom. Na realidade, sempre gostei de dérbis.

Wando

"Agora é que se começa a ver quem é quem no campeonato"

Como era o seu relacionamento com os adeptos? Caloroso?

Era sensacional chegar na rua e ser reconhecido pelas pessoas. O Benfica é grande. Em qualquer lugar, os Benfiquistas tratavam-me com muito carinho. Isso marcou-me muito. Ainda hoje, o meu filho vai a Portugal e diz-me: “Falam de você, o pessoal tem um carinho grande por você.” Há muita gente a querer falar comigo. Isso é que é importante, esse é que é o legado que se deixa.

Tenho família aí. A minha família toda é benfiquista. A minha irmã, o meu sobrinho…  No início de fevereiro, o Tiago vai chegar a Brasília e haverá Benfica no aniversário dele. Vai ser comemorado com um bolo com uma capa do Benfica. E eu estive há dois anos em Portugal e fui ao Museu do Clube…

Ficou impressionado com o que viu?

Foi maravilhoso. Eu também tenho uma história no Benfica, ajudei o clube a ganhar todos os troféus em Portugal e ainda joguei uma final da Taça dos Campeões Europeus. Fico feliz por fazer parte da história de um clube centenário. É importante ver um emblema que respeita os seus antigos jogadores, porque eles também contribuíram para que o Benfica seja grande como é.

Continua a acompanhar o futebol português e o Benfica em particular?

Acompanho, acompanho o Benfica, acompanho tudo. A equipa está ali, praticamente em cima do Sporting e do FC Porto. Quando os outros derem mole, o Benfica vai e engole. Tem a segunda volta do Campeonato pela frente. Agora é que se começa a ver quem é quem no Campeonato.

Entrevista e texto: João Sanches

Fotos: Arquivo / SL Benfica

Última atualização: 21 de março de 2024

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