"Queremos ganhar o Campeonato"

Numa equipa massacrada por lesões em jogadoras fundamentais, desde o início da temporada, Alice Clemente emerge como um raio intenso de luz num quadro de realismo competitivo a que falta uma pincelada de sorte.

Ainda recentemente, foi à transcendência que as jogadoras da equipa feminina de voleibol do Benfica foram buscar as forças que as impeliram a vencer um dérbi intenso, espetacular e incerto. E nesse dérbi, nessa mágica noite de sucesso, num triunfo arrancado a talento e força de vontade, a atacante do Benfica, ainda jovem, com 21 anos, liderou a equipa para uma vitória indiscutida, apesar da lesão de Isidora e do primeiro set, ganho de forma clara pelo Sporting.

Mas, assim que se iniciou o segundo parcial, as guerreiras do Benfica terçaram armas de uma forma que não deixou margem para dúvidas. "Foi um grande jogo, muito intenso, com muitos rallies, com muitas bolas disputadas como se fosse a última, e que agarrou os nossos adeptos. Aliás, o ambiente no pavilhão ajudou bastante, e, sinceramente, foi a primeira vez que jogámos perante tantos adeptos do Benfica. Espero que seja uma tendência para se manter, porque precisamos do calor deles, do seu apoio, e foi realmente reconfortante. Não sei se conseguiríamos uma reação como a que tivemos, sem os nossos adeptos, que são incríveis e muito calorosos. Gostamos muito da proximidade que existe entre a equipa e os nossos adeptos, e acredito que estamos a fazer as coisas bem e de uma forma que cativa os benfiquistas", declarou Alice Clemente, convidada do programa Protagonista, da BTV.

DÉRBI NO PAPO

Quem tivesse visto o primeiro set, dificilmente imaginaria o que aconteceu depois. A lesão de Isidora chocou as companheiras, os adeptos e, até, as adversárias. Os gritos de dor da principal atacante do Benfica ecoaram como alarmes de consciência no plantel benfiquista, e, assim que se reuniu, entre o primeiro e o segundo set, alinhou-se num objetivo determinado: superar a dor, física e de alma, de Isidora e fazer dela uma motivação suplementar para lhe entregar uma vitória simbólica, mas de grande significado.

"A lesão da Isidora chocou-nos, porque percebemos que se tratava de algo grave, pelos gritos, pela dor, e quando nos reunimos, depois do primeiro set, percebemos que tínhamos pela frente uma nova oportunidade. Ia começar um novo set, outra vez tudo a zeros, e teríamos de superar a nossa ansiedade e os nossos erros. Entrámos no jogo muito ansiosas, o que é normal, estes jogos mexem com as jogadoras. Tínhamos aquela ansiedade boa, antes dos dérbis e dos jogos importantes, mas começámos o jogo a cometer muitos erros e não conseguimos recuperar. A lesão de Isidora complicou mais, mas, assim que se iniciou o segundo set, as coisas começaram a sair à equipa, e fomos avançando, agora com mais confiança e aquela motivação de ganhar o jogo, pela Isidora e pelos nossos adeptos", confidenciou Alice Clemente.

A atacante do Benfica atou a equipa ao seu poderoso serviço e à sua batida forte para somar pontos, numa das melhores exibições individuais de uma jogadora do Benfica. E numa posição, de oposto, que não extrai todo o potencial de Alice Clemente, mas tornou-se necessário substituir Isidora. Os serviços pesados de Alice Clemente e os pontos amealhados na zona 4 viraram o jogo, e o Benfica venceu os 3 sets seguintes e, consequentemente, o jogo.

"A Isidora foi determinante, mesmo fora do campo. Ela não recuperou para o jogo, mas manteve-se no banco, a dar-nos força e a servir-nos de inspiração. Ela estava ali, ao nosso lado, e, para mim, foi fundamental, porque a substituí na posição de oposto, e ali estava ela a dar-me indicações, a dar-me força. A partir daí, o jogo começou a fluir, as coisas correram-me bem, a mim e à equipa, e fomos virando o jogo a nosso favor. Apesar de todas as contrariedades, conseguimos demonstrar a nossa qualidade, perante os nossos adeptos, que tanto nos acarinham e tanto merecem estas vitórias", assinalou a atacante do Benfica.

UMA EQUIPA INSPIRADA

Quase todas as grandes vitórias começam sempre antes do jogo, na preparação, no treino, no alinhamento astral entre as jogadoras, e na estrutura. No Benfica, a equipa feminina de voleibol está inspirada por elementos icónicos da modalidade no Clube e em Portugal.

O diretor-desportivo é o lendário professor José Jardim, sem o qual o Benfica nunca teria conseguido atingir a hegemonia que detém no voleibol, e o team manager, que pendurou as sapatilhas há poucos meses e ficará para a história como um dos jogadores mais marcantes do Benfica, é André Lopes.

"São ambos muito importantes para nós. Construíram uma história de grande sucesso na equipa masculina e agora estão a inspirar-nos para conseguir o mesmo com a equipa feminina. Os seus exemplos são incríveis para nós, e no dia a dia são pessoas que nos ajudam muito, ajudam-nos a crescer. Tem sido muito gratificante para nós, porque se trata de duas das maiores personalidades do voleibol do Benfica e de Portugal. Agora, imaginem o que é para nós tê-los a ajudar-nos, a inspirar-nos. O André Lopes começou esta temporada e, como team manager, acrescentou o seu conhecimento e é uma pessoa incrível. O professor já está connosco há mais tempo, mas é uma lenda e uma pessoa muito serena, que nos ajuda em tudo. E está muito focado em tornar esta equipa cada vez mais competitiva e com o intuito de ganhar. Porque, no Benfica, não há outro caminho, é ganhar ou ganhar. E ele dá-nos essa cultura, ele é exemplo vivo dessa cultura, dessa exigência. Mas com a exigência vêm as condições que o Benfica oferece. Não nos falta nada, é realmente espantoso", confessou Alice Clemente.

TREINADOR EXIGENTE

Exigência é uma das palavras mais escutadas nos corredores do edifício das modalidades do Benfica e no balneário da equipa feminina de voleibol, e está estampada na matriz da equipa. E, com o novo treinador, essa exigência reforçou-se. Quando chegou ao Benfica, Rui Moreira trouxe consigo o estatuto de bicampeão nacional e o sonho de treinar a equipa do seu clube do coração. As jogadoras sentiram a diferença.

"Sem dúvida. É um treinador muito exigente, trouxe ideias novas, e, após uma fase de adaptação, estamos mais entrosadas e mais perto daquilo que o treinador pede. É campeão nacional e não veio para o Benfica para deixar de o ser. Estamos a evoluir, estamos mais perto do que o treinador nos pede; ele é muito conhecedor e passa-nos esse conhecimento. Fala connosco sobre o que temos de fazer em campo, e isso faz-nos evoluir. Sempre com uma exigência máxima, porque só assim conseguiremos atingir os nossos objetivos. E queremos ser campeãs. Eu acredito que isso pode acontecer neste ano, apesar das contrariedades. Temos tido muitas lesões, algumas delas graves, que afastam as jogadoras por vários meses, e isso tem atrasado a nossa afirmação. Mas temos boas soluções no plantel, o Benfica é um clube que está a fazer uma grande aposta na formação. Cheguei aqui com 19 anos, a Marisa é da formação, as gémeas Garcez também vêm da formação, e todos puderam assistir ao jogo que a Mariana fez com o Sporting. Aos 18 anos, jogar com aquela personalidade, com aquela qualidade, de uma forma tão adulta e que nos ajudou bastante a triunfar... Este é o nosso futuro e que se confunde com o futuro da equipa. Olhamos para a seleção nacional de sub-22, que alcançou o seu primeiro apuramento para um Europeu da categoria, e vemos quatro jogadoras do Benfica: eu, as gémeas e a Marisa. Este é o caminho", sentenciou Alice Clemente.

Artigo publicado na edição de 2 de fevereiro do jornal O Benfica