Râguebi feminino

22 fevereiro 2024, 09h00

Arlete Gonçalves

Arlete Gonçalves com o troféu do Campeonato Nacional

O cume de uma montanha, visto de baixo, pode ser assustador, mas revela uma beleza do tamanho das dificuldades para lá chegar. No desporto, normalmente, o topo da montanha chama-se sucesso, e existem vários atalhos conhecidos para lá chegar. A ambição, o treino, a perseverança e saber que os escolhos são muitos e variados durante o percurso.

Que o diga a equipa feminina de râguebi do Benfica, na época passada, quando, no campeonato, realizou um percurso imaculado, sem derrotas, e depois, na final, no único jogo da temporada que não podia perder… perdeu. Foi com esse sentimento de perda, de sensação incompleta do dever, que o plantel iniciou esta temporada.

Novo treinador, novos métodos e, sobretudo, novo carregamento de ambição e de desejo de triunfar. Sabendo que no desporto de alta competição, muitas vezes, para ganhar é preciso conhecer as aprendizagens da derrota.

"Foi isso que aconteceu. É verdade que mudámos de treinador, mudámos os métodos, chegaram algumas jogadoras, mais jovens, que trouxeram uma nova energia, mas a forma como perdemos o título na época passada marcou-nos imenso. Tínhamos uma nova oportunidade para demonstrar que possuíamos capacidade de vencer o título e devolver ao Benfica essa alegria. Foram muitos anos sem conquistar o título, o Clube tem apostado na modalidade e nas suas equipas, está a fazer um bom trabalho na formação, mas todos sabemos que as coisas se tornam mais visíveis quando se ganham títulos. Aliás, no jogo da final, nesta temporada, sentimos isso, quando nos deparámos com as bancadas cheias. Era uma novidade para nós, mas serviu de motivação ver tanta gente a assistir a um jogo nosso", disse Arlete Gonçalves, capitã da equipa campeã de râguebi feminino.

Arlete Gonçalves

"Tínhamos uma nova oportunidade para demonstrar que possuíamos capacidade de vencer o título e devolver ao Benfica essa alegria. Foram muitos anos sem conquistar o título"

Arlete Gonçalves

DUELO FINAL

Como na época passada, de novo o Sporting, o eterno rival e campeão em título, era o derradeiro obstáculo que separava o Benfica do festejo de uma conquista que interrompia um ciclo de sete títulos consecutivos da equipa leonina.

"O Sporting tem uma grande equipa, mas nós sentimos, desde o início da temporada, que poderíamos vencer e superar o trauma da época passada. As novas jogadoras, ainda muito jovens, ajudaram a tornar a equipa mais forte, mantendo o espírito que nos caracteriza, um espírito familiar, mas de conquista. É evidente que uma equipa que, em duas épocas, perde apenas um jogo, na final da época passada, tem de estar a fazer as coisas bem. O treinador trouxe-nos uma nova abordagem, criou uma equipa muito competitiva, porque isso é fundamental no râguebi. É um desporto muito físico, embora de grande respeito mútuo, e temos de ser agressivas, temos de querer muito jogar e ganhar. Esse é o nosso espírito. Claro que também há o talento, e algumas das novas jogadoras têm, de facto, muito potencial, mas a força desta equipa é mental, é de atitude perante o jogo, perante o treino e perante o Benfica", revelou a capitã desta valorosa e triunfante equipa feminina de râguebi do Clube.

Arlete Gonçalves

NOVOS MÉTODOS

O treinador. Em desportos coletivos, em que a harmonia e a fixação no detalhe podem fazer a diferença e dar a capacidade para colocar toda a gente no mesmo comprimento de onda, o papel do treinador é de uma importância que não deve ser menosprezada. A chegada de Martim Aguiar, ex-selecionador nacional, modificou comportamentos individuais e melhorou os estímulos coletivos.

"Trata-se de um treinador com provas dadas na seleção nacional e veio ajudar- -nos muito. É uma figura muito respeitada e conhecedora. Passámos a treinar de uma forma diferente, alguns detalhes passaram a ter mais importância. Dá muito valor à evolução individual das jogadoras, preocupa-se que nós consigamos entender melhor o jogo, o que acabou por nos melhorar a todas. Não apenas as jogadoras mais novas, com muito ainda para aprender, mas também as jogadoras mais experientes, como eu, que melhorámos em alguns aspetos do nosso jogo. Sem dúvida que a sua chegada, com os seus métodos, com a forma como comunica as suas ideias e lidera o balneário, tornou a equipa melhor, mais competitiva e mais forte na hora das grandes decisões", clarificou Arlete Gonçalves, em declarações ao programa Protagonista, da BTV.

Arlete Gonçalves

"O Benfica tem investido imenso na recuperação do prestígio e da tradição do râguebi do Clube, e este pode ser um ano muito gratificante"

PAUSA NO CAMPEONATO

Um campeonato que termina em janeiro só acontece perante condições excecionais. É o caso da liga portuguesa de râguebi feminino, devido à pausa nas competições internas, durante dois meses, para que a seleção possa disputar os seus jogos da Liga B do torneio europeu de seleções.

"Serão dois meses sem competições em Portugal, será um desafio para os clubes, particularmente o Benfica e o Sporting, que terão muitas das suas jogadoras na seleção nacional, que vai participar no torneio europeu. Estamos no Grupo B e vamos defrontar seleções fortes, como a espanhola, que tem outro nível e já esteve no Grupo A, e em Mundiais. Nós estamos ainda longe desse nível, mas vamos lutar pelos melhores resultados e pelas melhores exibições. Será uma oportunidade para evoluirmos e dar mais um passo para dar mais visibilidade à modalidade e trazermos cada vez mais jovens para o râguebi. Esse será o maior desafio para o râguebi feminino, nos próximos anos, o de cativar mais jogadoras e melhorar as condições de treino e de jogo. Tecnicamente, a jogadora portuguesa até é reconhecida no plano internacional, mas fisicamente estamos muito longe destas seleções. Essa é a nossa maior desvantagem, mas, enquanto as jogadoras não se puderem dedicar exclusivamente ao râguebi, será muito difícil anular esse handicap. Porque, para melhorar fisicamente, é preciso treinar mais, dedicar mais tempo à modalidade, e nós somos completamente amadoras. Ou trabalhamos e, no final do dia, arranjamos força para treinar, ou as mais novas estudam, e isso também tem consequências na forma como se treina e como se compete. Há muita coisa por fazer, mas, claro, vamos disputar os nossos jogos com bravura, dando o melhor de nós e tentar evoluir", acrescentou Arlete Gonçalves.

Arlete Gonçalves

"O treinador trouxe-nos uma nova abordagem, criou uma equipa muito competitiva, porque isso é fundamental no râguebi"

VENCER A DOBRADINHA

Após os dois meses de paragem, as competições nacionais vão regressar, e a equipa do Benfica persegue o objetivo de conquistar a Taça de Portugal e a consequente dobradinha. Já está apurada para os quartos de final e com o conhecimento antecipado de que o Benfica e o Sporting podem defrontar-se nas meias-finais, se ambos vencerem na próxima eliminatória.

"Queremos a dobradinha, desde o início do campeonato, que esse é um objetivo, mas não adianta pensar já no possível jogo com o Sporting, nas meias-finais, se não vencermos o jogo dos quartos. E o jogo acontecerá depois de uma paragem de dois meses, em que a nossa equipa não vai treinar toda em conjunto. É uma incógnita como estaremos, enquanto equipa, quando voltarmos a treinar e a competir em Portugal. Claro que não vamos estar paradas, algumas de nós vão estar a competir, na seleção, e as outras a treinar e jogar alguns amigáveis para não perderem totalmente a forma. Mas alguma coisa acabará por se perder, e será preciso algum tempo, após o regresso, para recuperar as rotinas adquiridas e a forma que nos permitiu ganhar o campeonato. No entanto, temos uma confiança muito grande na equipa técnica, que saberá extrair o nosso melhor rendimento para conquistar a Taça de Portugal. É um grande objetivo nosso, e para o Clube será muito importante, para se estabelecer como a grande referência do râguebi feminino em Portugal. O Benfica tem investido imenso na recuperação do prestígio e da tradição do râguebi no Clube, e este pode ser um ano muito gratificante para a modalidade no Benfica. Nos femininos e nos masculinos. As duas equipas apoiam-se mutuamente, e acredito que a equipa masculina também pode ser campeã. Reforçou-se muito bem e está cada vez mais forte", conclui a capitã.

Artigo publicado na edição de 16 de fevereiro do jornal O Benfica

Texto: José Marinho
Fotos: Arquivo / SL Benfica
Última atualização: 21 de março de 2024