Reportagem

25 julho 2025, 10h00

Diogo Ribeiro

Diogo Ribeiro

Calções, mochila às costas, ténis na mão. Diogo Ribeiro entra nas instalações do Complexo de Piscinas do Jamor. O relógio marca 8h34 da manhã. Estamos na véspera da partida da Seleção Nacional para Macau, local do estágio de aclimatação e treino específico que decorreria entre 18 e 24 de julho de 2025. Campeão do mundo em 50 e 100 metros mariposa, o nadador do Benfica é a principal figura da comitiva, e competirá a partir deste domingo, 27 de julho, no Mundial – World Aquatics Championships, em Singapura.

Com a água da piscina olímpica do Jamor a rondar os 27 graus, Diogo Ribeiro deita-se perto dos blocos de partida e permanece imóvel. A reportagem do jornal O Benfica acompanha o momento em que é registada a recuperação do treino do dia anterior, ou seja, os índices de HRV (variação da frequência cardíaca). Passo cumprido em mais um dia de um exigente plano de trabalho. Antes de mergulhar, o jovem nadador, natural de Coimbra, já realizou uma sessão de meditação. Numa sala, isolado, em videochamada com uma instrutora – por norma, realiza-se presencialmente –, procede a um momento introspetivo.

"Sentados, fechamos os olhos e tentamos descontrair ao máximo", revela-nos, sobre uma etapa que costuma acontecer de 3 em 3 semanas.

Diogo respira fundo e concentra-se no que o rodeia, e sai, preparado para o apronto. Já com um preparador-físico junto a si, o jovem atleta olímpico das águias executa o designado dryland, um treino seco. Nota-se o foco máximo e a serenidade no prodígio da natação portuguesa. De pé, ingere um pouco de água, coloca os óculos e ajeita a touca. Às 9h05, lança-se à água.

"Entrei com 100 metros para aquecer. Depois fiz umas séries de 50, só drills, técnicas e velocidade com barbatanas", explica, em alusão a uma ferramenta que auxilia a nadar de forma mais veloz.

"Ao mesmo tempo, tens outra sensibilidade, porque na prova não vais nadar com barbatanas. Por isso, depois tens de fazer vários movimentos com o pé a ondular dentro de água para conseguires voltar a ganhar a sensibilidade do formato do teu pé, pois quando usas barbatanas, é como se o teu pé ficasse com o formato da barbatana", afirma.

Com mais umas pernadas para ganhar sensibilidade, assistimos a sprints de 15 metros, com o fito de entrar na velocidade da prova. Já com um elástico a puxá-lo, o benfiquista simulou a velocidade máxima que consegue atingir, agitando naturalmente a água e sendo ainda mais audível o som causado pelos movimentos de pernas e braços. Miguel Nascimento, também ele nadador do Benfica, chega à piscina. Cumprimenta Diogo e troca umas palavras com o amigo e colega, antes de o campão do mundo em 50 e 100 metros mariposa prosseguir o trabalho no seu ritmo habitual.

Diogo Ribeiro

"Hoje, tenho um dos melhores tempos, e eles [adversários] já vão olhar para mim"

Diogo Ribeiro

RESPIRAÇÃO E TÉCNICAS

O tubo respirador também faz parte da jornada subaquática. É usado para não atrapalhar a braçada ou parar o nado: "Para não ter de olhar para a frente ou para o lado para respirar, estou só focado na técnica que estou a fazer, debaixo de água. E isso ajuda muito, porque se eu não tiver o tubo tenho de estar sempre a respirar, e acabo por perder um bocado o que podia estar a fazer de técnica. Ou seja, com o tubo, se calhar faço 10 ciclos. Sem o tubo faria provavelmente metade, por ter de respirar. E ficava muito mais cansado. Com o tubo estamos sempre a respirar."

Diogo Ribeiro emerge da água, veste o fato e concentra-se.

"Tento sempre respirar fundo, ganhar mais ar no pulmão. Há técnicas para isso. Acalmar o corpo, descontrair, tentar tirar a tensão do corpo… E depois começo a aquecer, a bater nos músculos, para os estimular", diz.

Também pula, porque há uma maior dificuldade em estimular as pernas.

"Fora de água, rodo os braços com muita frequência. Tento fazer um ciclo de quatro rotações em cada braço. Bato os braços, tento fazer uma braçada de mariposa, uma braçada ampla, e depois concentro-me", sustenta.

Medalhas Diogo Ribeiro

A SIMULAÇÃO DE PROVA

O treino de Diogo Ribeiro inclui simulação de prova, cujo momento se aproxima. Ouvidas as últimas indicações técnicas, toca o sinal sonoro às 9h53, e o cronómetro de placa arranca. Iniciam-se os 50 metros livres.

"Fiz 21.81 segundos, que é muito perto do tempo que fiz no Europeu Sub-23 [21.67 segundos]. Dá-me confiança, mas não demasiada. Também não podemos exaltar-nos nem deixar o corpo descontraído. Sei que tenho de continuar a treinar, dia após dia", vinca, enquanto nos fala, sempre simpático, mas tendo já em mente o que irá fazer, de seguida, no ginásio.

Será treino explosivo para estimular a força rápida.

"Tenho a certeza de que amanhã [17 de julho] vou chegar aqui para o treino [ligeiro], antes da viagem, e vou estar mais descontraído e a braçada vai atacar mais rápido. Ou seja, hoje [16 de julho] fiz aquele tempo, mas com uma braçada lenta só a agarrar bem a água. Depois do ginásio, certamente vou estar mais explosivo, mais rápido, porque vai estimular muito a velocidade", completa.

Diogo Ribeiro

METAS E AMBIÇÕES PARA ESTE MUNDIAL: "VOU ESTAR A 100%"

Em Samorin, na Eslováquia, no recente Campeonato da Europa Sub-23, Diogo Ribeiro evidenciou toda a sua classe, ao conquistar o ouro nos 50 metros livres e mariposa e a prata nos 100 metros mariposa. Uma espécie de tubo de ensaio para este Mundial em Singapura.

"Ganhei uma certa confiança nos 50 metros livres, em que bati o recorde nacional. Nos 100 metros mariposa continuo à procura do meu melhor tempo, que aconteceu no ano passado no Mundial, quando fui campeão do mundo. Ainda não consegui fazer isso no Europeu, mas também não estávamos na nossa forma máxima. Por isso é que digo que os 50 metros livres me surpreenderam muito, porque, supostamente, mesmo não estando no máximo nível, consegui fazer aquele tempo, um tempo de grande nível, um tempo de final olímpica, e às vezes até de medalhas", analisa, detalhando de seguida os 23,01s nos 50 metros mariposa: "É uma marca que dá para entrar nas competições a um bom nível, mas já há muita gente a fazer 22 segundos. Eu queria ter feito 22 também, porque ao ver que os 50 livres foram tão rápidos, pensei que ia conseguir fazer os 22 segundos."

Diogo Ribeiro

Para a história fica mais uma jornada notável do atleta de apenas 20 anos, cujo trabalho aponta para o pico de forma no Mundial.

"Acreditamos que sim, que vou estar a 100% no Mundial", diz, recusando elevar a fasquia.

"Não aponto a lugares. Quero melhorar os meus tempos. Sei que, se estivermos sempre a melhorar os nossos tempos, vamos acabar por passar cada fase, chegar a finais, ganhar medalhas. Por isso, é o que procuramos neste momento", assume, sem a pressão eventual que os títulos do ano passado possam trazer.

Na equação há um dado novo. Hoje, Diogo Ribeiro é muito mais conhecido.

"Antes, não olhavam tanto para mim, porque tinha um muito pior tempo do que eles, ou só um pior tempo do que eles, mas, hoje em dia, tenho um dos melhores tempos, e eles já vão olhar para mim, com certeza, porque era o que eu fazia com os outros", afirma, soltando uma gargalhada.

Superstições Diogo Ribeiro

AVEIA E BIFES NA DIETA ALIMENTAR

No dia em que acompanhámos Diogo Ribeiro, o despertador tocou às 7h00. O pequeno-almoço é essencialmente à base de panquecas de aveia, ou leite de aveia com cereais e nutrientes mais proteicos até porque se segue um sprint de velocidade/simulação de prova nos 50 metros livres. Ruma então ao Jamor e, se normalmente ingere uma barra energética entre o treino de natação e o ginásio, desta vez tal não ocorreu.

"Estamos numa fase em que tenho de comer menos, e coisas muito secas para secar o corpo, mas atenção, o pequeno-almoço não é só uma panqueca, são 3 ou 4", admite, entre risos, e reforça que isso "dá até ao almoço".

A refeição seguinte contempla bifes grelhados e arroz, sem molho: "Normalmente, quando estamos em carga comemos muita quantidade, que é para crescer, para aumentar os músculos. Agora, estamos numa fase mais de secar a gordura, e tentamos não comer muita gordura, nem muitos hidratos, mas sim muita proteína para os músculos incharem, mas só o músculo mesmo, de forma a tentar tirar a gordura do corpo."

Diogo Ribeiro

HABITUADO A VIAGENS LONGAS

Diogo Ribeiro está habituado a viagens longas, e a competir em fusos horários diferentes.

"Eu gosto que as provas sejam longe, mas depois as viagens cansam também", confessa.

Para Singapura, o plano de viagem incluiu uma escala de cerca de 3 horas e dois voos de 8 horas: "Tem de ser, mas eu até acho que é uma coisa boa. Sempre gostei. Já fomos a Fukuoka e fui 2.º classificado [nos 50 metros mariposa no Mundial]. Por isso, acho que me dou bem com isso. É bom irmos mais cedo, por causa da aclimatação e do fuso horário e porque a humidade lá é muito grande."

Diogo Ribeiro

A AFINAÇÃO DOS DETALHES

Após o êxito no Campeonato da Europa Sub-23, Diogo Ribeiro estagiou em Tenerife, mais uma etapa de preparação que "correu bem".

"Estava com muita velocidade. O primeiro treino que fiz no flume, que é a piscina de corrente, correu muito bem. Fiz 110% do meu melhor tempo, ou seja, consegui ganhar 10% do meu melhor tempo e nadar nesse ritmo. Tive uma pequena infelicidade, uma minilesão, mas depois de 3 ou 4 dias pude voltar a nadar normalmente", explica.

Entre os aspetos a afinar, o jovem olímpico afiança que já melhorou o seu "pior detalhe", o subaquático.

"Antes, fazia 5,5s, já estou a fazer cerca de 5,3s, por aí… Temos de continuar a melhorar, mas já está muito melhor. Mesmo o salto, já está muito melhor. Quando fui campeão do mundo nos 50 metros mariposa, saía quase um corpo atrás. Se calhar, agora já só saio meio corpo, porque eles continuam a fazer 5,0s. É muito bom. Acho que esse era o detalhe principal que eu tinha de melhorar, porque o resto da prova é mesmo do outro mundo", admite.

Diogo Ribeiro

"Olha o benfiquista! Não é o Diogo, é o benfiquista. Por isso, agradecer muito aos adeptos"

ETERNAMENTE GRATO AO CLUBE: "O BENFICA NÃO SE EXPLICA, VIVE-SE"

E m 2024, Diogo Ribeiro competiu pela primeira vez nos Jogos Olímpicos. Inicia agora um novo ciclo de 4 anos rumo a Los Angeles 2028, ligado contratualmente ao Benfica, com o qual renovou precisamente até 2028.

"Ainda bem", diz-nos, de pronto, quando introduzimos a importância do Glorioso na sua carreira.

"É como eu costumo dizer, o Benfica tem um papel não só na minha vida profissional, mas também na minha vida pessoal, porque é quem me paga o salário. Agora, sou um atleta profissional, sei os meus deveres e os meus direitos, e estou superfeliz por estar com o Benfica. Não podia estar numa casa diferente, melhor do que esta. Estou no clube do meu coração, estou no clube que me apoiou desde que tive o meu acidente de mota, e nunca me vou esquecer disso. No momento em que eu estava fora do mapa para toda a cidade onde vivia, Coimbra, um clube tão grande como o Benfica foi até a minha casa falar comigo e com os meus pais. Nunca me vou esquecer disso, e é como digo: por mim, vou ficar no Benfica para sempre, vai ser o meu único clube", sublinha, apontando para o símbolo da águia que tem ao peito.

"Isto aqui não se explica, vive-se. Não dá para explicar por palavras", diz.

A relação com os adeptos tem sido reflexo de total simbiose.

"Recebo muito carinho dos adeptos, muitas mensagens. Mesmo na rua, sei que muitas pessoas me conhecem, mesmo muitas, porque eu estou no Benfica. Na rua, pedem-me para tirar fotos", dá-nos conta, revelando a forma como é abordado.

"Olha o benfiquista, não é o Diogo, é o benfiquista. Por isso, agradecer muito aos adeptos, porque essas coisas também motivam muito para o futuro", sublinha.

Reportagem publicada na edição de 25 de julho do jornal O Benfica

Texto: Paulo Nunes Teixeira
Fotos: João Paulo Trindade / SL Benfica
Última atualização: 25 de julho de 2025

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