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Futebol
28 fevereiro 2018, 20h14
Domingos Soares de Oliveira
Em entrevista à BTV, Domingos Soares de Oliveira abordou vários aspetos do Relatório e Contas, salientando a relevância da significativa descida do passivo e dos benefícios estratégicos que o Benfica vai retirar do abatimento de cerca de 100 milhões de euros na dívida bancária.
O Sport Lisboa e Benfica – Futebol SAD teve 19,1 milhões de euros de lucro no primeiro semestre do exercício 2017/18. Que leitura faz dos resultados apresentados?
Do ponto de vista dos rendimentos houve apenas um decréscimo de receitas na componente UEFA, pela fraca performance que tivemos em termos de Champions League. Em relação a todas as outras rubricas tivemos um crescimento moderado ou muito positivo. Do ponto de vista da alienações de direitos desportivos, tivemos um contributo de mais do dobro relativamente àquele que tínhamos tido no primeiro semestre da época 2016/17. Temos um crescimento total de receitas de cerca de 124%.
A quebra do passivo é quase o dobro da que se registou no ativo. Que análise se pode fazer nesta dialética?
De há uns anos a esta parte, definimos uma orientação estratégica no sentido de reduzir o passivo. Isso faz-se com o dinheiro que conseguimos nas nossas operações e também com a venda de ativos, em particular de jogadores. Fechámos o ano passado com um valor positivo no saldo de ativo e passivo, o que nos permitiu ter capitais próprios já com um valor significativo. Neste ano tivemos um resultado positivo de 19,1 milhões de euros neste semestre, o que permitiu aumentar o contributo das operações relativamente a esta redução de passivo que se cifra nos 53 milhões de euros, enquanto a diminuição do ativo é de cerca de 33 milhões. Portanto, uma tendência muito positiva.
"ESTRATÉGIA INTERNACIONAL JÁ DÁ OS PRIMEIROS PASSOS"
O mercado português está perto de estar esgotado no que diz respeito à possibilidade de captação de receitas?
Se olharmos para as principais componentes onde vamos buscar o dinheiro, aquilo que se percebe é que em termos de direitos televisivos tivemos algum crescimento, mas não há espaço para crescer muito mais. O nosso contrato é a 10 anos, está contratualizado, terá algum crescimento, mas não significativo. Se olharmos para a componente patrocínios, o Benfica faz quase o pleno (a exceção é a venda do naming do Estádio) do ponto de vista dos streams onde pode ir buscar dinheiro.
Se olharmos para as receitas de bilhética, elas têm crescido, mas já se nota que 70 por cento dos lugares são pré-vendidos. A possibilidade de crescermos só a pensar na componente nacional é curta. Por isso é que, de há três anos a esta parte, definimos uma estratégia de internacionalização que está a dar os primeiros passos, já com alguns resultados concretos na China, no mercado americano também, que acredito que nos próximos dois anos no possa dar aqui um contributo. A nossa principal orientação, se queremos continuar a crescer em termos de receitas, tem de ser não ficarmos à espera daquilo que o mercado português pode crescer e irmos à procura de novos mercados.
Nos resultados apresentados também se percebe que há um crescimento da massa salarial. Que explicação pode dar para esse incremento?
O talento é uma coisa que se paga. Para termos as pessoas mais talentosas a trabalhar connosco, temos de estar preparados para pagar, porque elas não estão ligadas ao clube apenas por uma questão emotiva, mas também racional. Aquilo que se tem sentido em todos os clubes é que os salários têm crescido, nalguns casos até a uma velocidade superior àquilo que é o crescimento das receitas. Um talento que esteja hoje no Benfica, que tenha um salário com o qual se sinta confortável, mas receba uma oferta lá de fora três ou quatro vezes superior, é um talento que estará menos confortável para vencer aqui.
Vivemos num mundo concorrencial internacional e sabemos que para reter os jogadores temos de acompanhar o crescimento salarial. É uma situação que se vai acentuar nos próximos anos. Fundamental no Benfica é respeitar os referenciais que a UEFA nos dá, que é a componente salarial ter de se situar abaixo dos 70% do total de receitas – e temos conseguido fazer isso.
"VAMOS VER CADA VEZ MAIS TRANSAÇÕES MILIONÁRIAS COMO A DO NEYMAR"
Num mercado que está a disparar em termos de transações e de salários de jogadores, como é que o Benfica pode fazer face a essa realidade?
Aquilo que vamos ver em termos futuros será cada vez mais transações milionárias como a do Neymar. Quando se pergunta qual é a lógica de uma contratação como aquela, inicialmente as pessoas dizem que é aberrante, mas a visão dos grandes clubes é que isso lhes dá uma visibilidade global que muitas vezes o clube não consegue alcançar sozinho.
O PSG é um excelente exemplo: um clube francês com capacidade de investimento significativa e que precisava de chegar a muitos mais mercados. O Benfica terá de acompanhar essa tendência. Não significa que tenhamos a capacidade de contratar Neymares ou Messis, mas temos de ter a capacidade de, se queremos talento, estarmos preparados para pagar esse talento.
O presidente Luís Filipe Vieira anunciou a decisão de abater 90 a 100 milhões de euros de dívida bancária. Que novo enquadramento é que se colocará ao Benfica com tal abatimento?
Há três aspetos cruciais nesta estratégia que o presidente anunciou em Braga: o primeiro é a nossa não-dependência do sistema financeiro português – passa a estar praticamente reduzida a uma expressão de contas caucionadas, o que nos dá uma liberdade de atuação muito significativa. O segundo aspeto é o do impacto no balanço: o passivo exigível vai ser reduzido na proporção que o presidente falou. E um terceiro aspeto diz respeito às garantias que estão associadas aos empréstimos atuais e que vão ser libertadas. Do ponto de vista dos contratos comerciais, teremos esses mesmos contratos na mão, não dados como garantias, para podermos fazer o que entendermos de melhor para o Benfica.
"DIFERENÇAS EM PORTUGAL VÃO ACENTUAR-SE"
Por vezes questiona-se por que razão o Benfica não paga toda a dívida bancária. Em termos de gestão, qual é a necessidade de não se liquidar toda a dívida?
Quando a dívida é construída não havendo um acionista de referência grande que esteja na disposição de pôr aqui 500 milhões de euros, o Clube é muito alavancado em termos de dívida para poder fazer investimentos. Vamos imaginar que o futuro do Benfica é viver com os três empréstimos obrigacionistas que somam cerca de 150 milhões de euros. Se eu conseguir gerar, com esses 150 milhões de euros, investimentos que me deem resultados acima do custo desse endividamento e conseguir um retorno superior, significa que estarei a criar um valor dentro do Benfica sem comprometer as contas.
As pessoas preocupavam-se com o passivo e tinham razões para isso porque passámos uma fase muito intensa do ponto de vista de investimento. À medida que vamos reduzindo as nossas necessidades de investimento, também o nosso passivo é menor, mas ainda assim, na minha opinião, um passivo controlado abaixo daquilo que é um ano de receitas é um passivo perfeitamente gerível por parte do Benfica.
Estamos numa época em que o funil de acesso à Liga dos Campeões está mais apertado. Que condicionantes se colocam ao futuro do Clube e à projeção da gestão dos próximos tempos?
Vai haver em Portugal uma diferença ainda mais acentuada que noutros países entre os clubes que acedem à Liga dos Campeões e à Liga Europa e os clubes que não estão lá. Os prémios da UEFA estão a crescer significativamente. No ciclo 2018-2021 crescem quase para o dobro, e os clubes que consigam estar na Champions – o primeiro classificado diretamente ou o segundo através de um processo de qualificações – vão ter um valor de receita acima daquilo que têm gerido até agora. Serão acentuadas as assimetrias entre clubes na Liga Europa e clubes na Champions.
Do nosso lado, aquilo que temos feito é ser extremamente conservadores quando preparamos um orçamento, mas não nos adianta sermos demasiado conservadores, porque ou estamos na Champions logo no final do Campeonato – porque somos campeões e aí conseguimos desenhar muito bem o que pode ser o orçamento – ou, se estivermos numa situação de possível acesso durante o período de pré-época nacional, teremos só de preparar o orçamento quando chegarmos a esse apuramento afinal. Queremos o apuramento direto, mas, se não for, queremos estar na Champions. O orçamento pode sofrer ajustes, e isto significa também maior ou menor necessidade do ponto de vista de venda de atletas.
Texto: João Sanches
Fotos: Tânia Paulo / SL Benfica