Basquetebol Feminino

26 maio 2025, 12h34

Inês Faustino

Inês Faustino com o troféu do Campeonato Nacional

Qualquer benfiquista já terá ouvido, sobre o seu clube, que o Manto Sagrado tem um determinado peso em material sintético e outro ainda maior em tradição e responsabilidade. É por isso que se diz que a camisola do Benfica pesa mais que as outras. No caso da equipa feminina de basquetebol, é também a bola que, em momentos críticos da época, em que se decidem títulos, fica mais pesada e é mais difícil de colocar no cesto.

Terá sido isso que aconteceu a dois minutos do fim do 2.º jogo da final frente ao Esgueira quando, inexplicavelmente, a equipa encarnada largou uma vantagem de 11 pontos e expôs-se à possibilidade de perder a partida, no prolongamento.

Em entrevista no programa Protagonista, da BTV, e em conversa comigo, Inês Faustino explicou as diferenças de jogar no Benfica, a ansiedade de ver a conquista do Campeonato a aproximar-se e de como isso pode ter impacto no rendimento das jogadoras, naqueles instantes finais.

Inês Faustino

JUSTAS CAMPEÃS

"Foi uma época muito dura, com várias adversidades, muitas lesões, e foi precisa muita resiliência. Mas nunca houve momentos de desânimo, momentos em que não acreditássemos que poderíamos chegar ao fim da temporada com os nossos objetivos conquistados. As lesões atrapalharam nalguns momentos, mas a qualidade existente no plantel permitiu sempre superar os problemas. E mesmo quando não conseguimos vencer a fase regular do Campeonato, isso não nos tirou a convicção de que poderíamos conquistar o Campeonato. Sentimos, no início do play-off, que o trabalho realizado durante toda a temporada poderia dar frutos na fase decisiva da Liga. E deu. E acho que fomos campeãs com toda a justiça."

COMPENSAR OS TÍTULOS PERDIDOS

"Fui campeã, pela primeira vez, muito nova, no Vagos. Depois, foram mais de 10 anos a representar vários clubes, a 'roubar' alguns títulos ao Benfica, mas sem nunca conseguir ser campeã de novo. Quando recebi o convite para jogar no Benfica, senti que tinha chegado a minha oportunidade de jogar num grande clube mundial e de ser campeã novamente. Sinceramente, posso dizer que esperava por esse convite, porque o Benfica tinha tido problemas na época passada com as suas bases, e senti que o Clube poderia tentar resolver esse problema. Vim para o Benfica, e a adaptação foi muito rápida, porque aos 32 anos considero ter maior maturidade do que quando fui jogar para Espanha, com 20 anos, e porque também conhecia, da Seleção, várias jogadoras com quem ia jogar. Senti que era a minha oportunidade para compensar todos aqueles anos sem ser campeã, mais uma vez."

Inês Faustino

"Foi uma época muito dura, com várias adversidades, muitas lesões, e foi precisa muita resiliência. Mas nunca houve momentos de desânimo"

Inês Faustino

BOLA PESADA

"No Benfica, a bola pesa mais. Durante anos, jogando contra o Benfica, por equipas com menor expressão, nunca senti a pressão que é jogar no Benfica. Nesses clubes, se falhares um lançamento que pode ser decisivo, ninguém te vai recriminar por isso. No Benfica, a bola pesa muito mais, e a bola entrar no cesto ou não pode fazer uma diferença brutal, porque jogamos num clube grandioso, em que não se tolera a derrota. Quem joga no Benfica é uma das primeiras coisas de que se apercebe, a forma como a pressão de ganhar pode mexer connosco, pode até condicionar o nosso rendimento. A jogar contra o Benfica, nunca senti a mesma pressão que sinto quando represento o Clube. Isso é inquestionável."

JOGO DO TÍTULO

"O que se passou nos últimos dois minutos do 2.º jogo da final [do play-off do Campeonato] é o reflexo da bola que pesa mais no Benfica. Estávamos com uma vantagem de 11 pontos e, num ápice, ficámos sem ela e fomos a prolongamento. Porque, à medida que o jogo se aproxima do fim, começamos a sentir a pressão de ganhar, porque está muito perto. É nessa altura que o cesto fica mais pequeno. E também é verdade que o Esgueira começou a lançar de todo o lado e as bolas a cair. Sentimos essa pressão e permitimos a recuperação que, se calhar, as jogadoras do Esgueira já nem pensavam que seria possível. Foi dramático, porque sentimos que estávamos tão perto e, de repente, tínhamos um prolongamento pela frente."

Inês Faustino

"No Benfica, recuperaram-me, e isso deu-me uma motivação suplementar, porque sabia que os jogos iriam ser muito duros e queria estar lá dentro a ajudar as minhas colegas"

MALDITAS LESÕES

"As lesões complicaram um pouco, até porque algumas delas aconteceram já no início do play-off. Aconteceu comigo e com a Inês Viana e, de repente, estávamos sem nenhuma base na equipa, até porque a Marta também se lesionou no início da temporada. Lesionei-me no início do play-off e cheguei a pensar que não jogaria mais nesta temporada, o que me transtornou bastante. Mas estamos no Benfica, onde a estrutura que existe é muito boa, é realmente top e conseguiram recuperar-me num mês, o que me permitiu aparecer na final em condições de ajudar a equipa a vencer o Campeonato. Noutro clube qualquer, eu não teria voltado a jogar nesta temporada e teria falhado os jogos da final. No Benfica, recuperaram-me, e isso deu-me uma motivação suplementar, porque sabia que os jogos iriam ser muito duros e queria estar lá dentro a ajudar as minhas colegas. Consegui, e estou muito feliz por isso."

O ANDAMENTO NA EUROPA

"Acho que tivemos uma boa participação na Europa, mesmo perdendo quase todos os jogos. Defrontámos o Besiktas, uma potência no basquetebol feminino, e nos outros jogos fomos sempre competitivas. Ganhámos ao Namur, na jornada inaugural do nosso grupo, e fizemos jogos muito bons. A nossa participação na EuroCup Women permitiu-nos também jogar num andamento diferente do que temos na nossa Liga. Isso foi muito importante para nós, até para o play-off, porque chegámos lá a jogar num ritmo diferente. Foi muito importante, para nós, na conquista do título, termos andado a disputar a EuroCup Women contra grandes equipas e a obrigar-nos à superação. Foi uma experiência incrível, e acredito que nos deu aquilo que precisávamos para nos impormos em Portugal."

Inês Faustino

"Jogar na EuroCup Women foi uma experiência incrível, e acredito que nos deu aquilo de que precisávamos para nos impormos em Portugal"

A FORÇA DA NATUREZA

"Temos um grupo com jogadoras de muita qualidade, e só assim poderíamos ser campeãs. Ajudamo-nos muito umas às outras mesmo fora da quadra, e isso nota-se em campo. Por exemplo, quando eu e a Inês Viana estávamos lesionadas, a Rapha [Raphaella Monteiro] foi obrigada a assumir funções que, muitas vezes, são as bases que executam. Mas a Rapha é uma jogadora incrível, tem uma força tremenda, é uma verdadeira força da natureza. É o tipo de jogadora que nos arrasta atrás dela. É uma jogadora muito física e também muito talentosa. Foi determinante nos piores momentos da equipa e, claro, nos momentos decisivos da temporada. É uma inspiração para todas e é uma excelente pessoa, o que também ajuda a que seja muito admirada no plantel."

INÊS VS INÊS

"Isso nunca se colocou entre mim e a Inês Viana. Somos amigas, fora do campo, já nos conhecíamos da Seleção, gosto muito dela e acho que somos complementares. Ela é muito forte numas coisas, eu sou mais forte noutras. A Inês, desde logo, é a voz de comando, é a jogadora que todos gostamos de escutar, é uma líder, em campo e fora dele. Já passou por muito, já sofreu muito com as lesões e, felizmente, neste ano, ajudou-nos imenso. Eu considero-me mais uma jogadora de organizar a equipa, em campo, de penetrações, mais até do que de tiro exterior. É verdade que, na final, alguns tiros saíram bem, mas, francamente, sinto-me bem é a organizar a equipa ofensivamente, com passes e com penetrações. Na final, porque tinha recuperado da lesão há pouco tempo, tive de me conter um pouco nessas penetrações, mas, lá está, somos uma equipa muito unida, muito complementar, e todas nós conseguimos aportar coisas à equipa."

Artigo publicado na edição de 23 de maio do jornal O Benfica

Texto: José Marinho
Fotos: Arquivo / SL Benfica
Última atualização: 26 de maio de 2025

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