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Nesta terça-feira, 23 de abril, assinala-se o Dia Mundial do Livro. Lembramos, por isso, uma obra fascinante, publicada em 1925 e dedicada aos sócios do Sport Lisboa e Benfica, que permite conhecer, pelo menos em parte, a visão de Cosme Damião em relação ao futebol e a alguns aspetos da vida associativa desportiva.
23 abril 2024, 13h00
Apontamentos e Recortes sobre Football Association
No epílogo do primeiro quartel do século XX, Cosme Damião era a principal figura do Sport Lisboa e Benfica. Vice-presidente da Direção e antigo jogador, era já um experiente capitão-geral, cabendo-lhe a responsabilidade da política desportiva do Benfica. Por ele passavam todas as decisões do futebol benfiquista. E tinha vasta experiência na imprensa desportiva, nomeadamente no jornal Sport de Lisboa. Da introdução do livro, na qual Cosme Damião começa por assinalar os seus 20 anos de envolvimento no futebol, transparece um certo desencanto com os caminhos trilhados pela modalidade em Portugal. Este fundador do Benfica acusa alguns dirigentes de "mercantilismo desregrado" e "jogadores que, na sua maioria, aspiram ao profissionalismo, não pensando em melhorar o seu jogo […], pois cultivam-no apenas com a mira de conseguir dinheiro".
Cosme Damião salienta, em relação ao passado, a existência de mais jogadores, "mas bastante piores" e, parte deles, carentes de desportivismo, mais interessados em ganharem, dir-se-ia hoje em linguagem corrente, a qualquer custo. Cosme Damião afirma ainda que "é absolutamente indispensável" que se reaja a esse estado do futebol, motivando-o, por certo, a publicar esta obra.
Apontamentos e Recortes sobre Football Association começa pelas origens do futebol e pela introdução deste desporto em Portugal, enfatizando as movimentações futebolísticas ocorridas em Belém, onde, em 1904, o Sport Lisboa (e Benfica) foi fundado. São também revelados alguns aspetos da fundação e dos primeiros anos de vida do Benfica, os primeiros jogos e torneios disputados, bem como são mencionados alguns protagonistas.
Prossegue com considerações gerais sobre futebol e associativismo, procurando transmitir às novas gerações ensinamentos importantes sobre a gestão dos destinos dos clubes. Refere, por exemplo, que "jamais instituição alguma progredirá quando minada pela incoerência, indisciplina, mesquinhice de interesses, diversidade de pensamentos ou anarquia de ação", ou ainda, que "o interesse e a boa crítica são, dentro de um clube, as forças morais, mas estas não se devem converter em instrumentos de imposição, ou predomínio, porque se tornarão antipáticas, perigosas e até mesmo prejudiciais". Segundo Cosme Damião, "quando nos associamos a um clube, não deve ser com o fito de destacarmos a nossa personalidade, mas, sim, para defender os seus interesses sacrificando muito o nosso amor-próprio e sempre o eu pessoal".
Entre as considerações gerais, são ainda abordados aspetos como a idade ideal para o início da prática de futebol ("14 anos, antes será prejudicial porque os músculos não estão ainda formados para resistir a um encontro"), a possibilidade de jogar até aos 45 anos "sempre que não tenha abandonado o exercício durante algum tempo", os benefícios para a saúde e vida em sociedade, a necessidade de ginástica todos os dias ao invés da prática desportiva esporádica e abusiva, a boa alimentação ("pouca carne, muitos legumes, verduras, ovos, leite e não tomar absolutamente álcool, muito principalmente na véspera do dia de jogo"), não se dever fumar "antes do jogo nem tão-pouco na manhã do dia em que se realiza o encontro, porque isso ocasiona uma respiração defeituosa e fatigante" e, por último, evitar jogar quando acometido por "alguma enfermidade peitoral, como resfriamentos e constipações".
Cosme Damião deixou uma obra onde vinca a sua visão sobre o futebol e o desporto em geral, à luz da sua época
A IMPORTÂNCIA DE CONHECER AS LEIS DO JOGO
O capítulo seguinte respeita a instruções gerais para os jogadores. Nesta parte do livro, Cosme Damião transmite ensinamentos técnicos e defende que o conhecimento das regras e leis do jogo é fundamental. "Ninguém deve começar a jogar antes de ter estudado as respetivas leis e sem ter presenciado desafios corretamente jogados", assevera. E acrescenta que o treino é indispensável, e que só com a prática se apreendem conceitos sobre jogar futebol. Deste ponto prossegue para características de personalidade relevantes dos jogadores, tais como entusiasmo, perseverança, vigor e sentido coletivo. "Não se julgue que, para se ser jogador de futebol, se requer unicamente boa musculatura […]. De que servirá um jogador ter bom pontapé se não possuir um funcionamento regular de pulmões e de coração […]? Ou que careça, por desgraça, de espírito entusiasta ou seja tacanho de cérebro?"
A obra continua com a secção mais extensa, relativa a princípios táticos e técnicos, dissertando sobre as posições dos jogadores e a forma como se deve atuar em cada uma delas. Cosme Damião considera que "todo o jogador se especializa" e que a tática "é toda diferente segundo o lugar que o jogador ocupa no campo".
OS PRINCÍPIOS, SEGUNDO COSME DAMIÃO
Intitulado "Alguns princípios elementares do jogo", o primeiro referido é a "Combinação". Para o fundador do Benfica, esta era "a base do jogo", e explica: "Tem mais probabilidades de êxito um grupo composto de jogadores medíocres, com vontade e que combinem, do que outro onde todos ou quasi todos são considerados bons, mas que não se entendem." Cosme Damião defendia passes rápidos e curtos, reservando os passes longos para campos com más condições ou situações de jogo que os exijam. O segundo é "Enganar", ou seja, "avançar a trechos individuais com a bola junto aos pés mudando alternativamente a bola de um pé para o outro". Porém, adverte: "Não se creia que, por regra geral, esse método é eficaz. Há a maior conveniência em aprender a enganar, mas não se deve abusar. É bom, mas é preciso saber dominar a bola." Outra forma de "engano" é o que se chama hoje "jogar de primeira": "Chega um momento em que se adquire muita direção para fazer seguir a bola sem a parar, […] o que torna o jogo mais rápido e mais interessante."
Outras das componentes técnicas explicadas são a receção de bola ("curva ligeiramente as pernas de forma a que a bola, batendo-lhe nas tíbias, salta justamente para diante dele"; ou "o jogador deve colocar o pé de tal maneira, que a bola se encontre entre o chão e a sola da sua bota, ficando assim imóvel"); os passes ("uma das coisas a que o jogador deve dedicar a sua melhor atenção"; "os passes curtos e baixos devem preferir-se aos passes fortes e altos"; "considera-se um bom passe quando a bola é enviada para diante daquele que a tenha de receber […], mas, se um adversário tiver probabilidades de intercetar, é preferível dirigi-la aos pés do companheiro"); o jogo de cabeça ("não é suficiente receber a bola na cabeça e deixá-la resvalar para qualquer direção"); e, por fim, o egoísmo, ou a indispensável ausência do mesmo ("agrada mais um passe oportuno do que um esforço individual desnecessário, o que só por casualidade poderá ser proveitoso"; "o jogo de futebol não se constitui só pelo incidente do golo, mas pelo conjunto de movimentos que se executa").
A TÁTICA, O ESQUEMA E AS POSIÇÕES
Estabelecidos os princípios gerais, Cosme Damião envereda pela tática. "A anulação da personalidade em benefício do conjunto, e a perfeita noção de que um futebolista é uma parte de um onze, e este é que há de ganhar pelo esforço de todos, é o que todos os jogadores devem sempre ter em mente, se quiserem ser conduzidos à vitória", defende. Guarda-redes, dois defesas, três médios e cinco avançados, era o esquema vigente. E, para cada posição, Cosme Damião esclarece o que se espera de cada jogador e o que cada um destes tem de fazer nos jogos e treinos, além de se socorrer de esquemas sobre os posicionamentos dos guarda-redes.
São muitos os conceitos táticos e técnicos explanados ao longo das 52 páginas dedicadas a esta temática. Por curiosidade, note-se como começa o texto sobre os guardiões das balizas, socorrendo-se de um axioma ainda em voga na atualidade: "Costuma dizer-se: Nasce-se guarda-redes, não se fazem, e todos os jogadores de futebol reconhecem a verdade deste provérbio." Esta posição específica requer, segundo Cosme Damião, "inteligência, sangue-frio, rápida decisão, rara presença de espírito, vista excelente e golpe de vista muito preciso. É conveniente que seja alto e possua grandes braços, tenha agilidade e flexibilidade, e bom pontapé para que possa aliviar o seu campo".
Neste livro são também revelados alguns aspetos da fundação e dos primeiros anos de vida do Benfica, os primeiros jogos e torneios disputados
PERFIL, RESPONSABILIDADES E QUALIDADES DE UM CAPITÃO
As características do capitão de equipa também são escalpelizadas: "Importa que tenha uma grande autoridade e um grande ascendente sobre os seus homens. É necessário que em cada clube se escolha entre os velhos e fiéis jogadores, que durante muitos anos te nham sabido, tanto pelo seu zelo e suas qualidades mo rais como pelo seu conhecimento e ciência do jogo, conciliar a estima dos seus camaradas. Além disso, vale mais ter como capitão um jogador consciencioso que um jogador brilhante. […] Deve assegurar-se em primeiro lugar da boa conduta dos seus homens e vigiar o seu vestuário. Exigir disciplina severa inteligentemente aplicada. Do onze é o único que tem direito a elevar a voz, não querendo dizer que deva gritar a torto e a direito durante todo o tempo que dura o desafio. Deve encorajar os mais nervosos e estimular aqueles que sabe inclinados à moleza. Para cada, deve adotar a melhor tática. […] Durante a semana deve ser severo nos exercícios do treino. […] O capitão representa o grupo em todas as ocasiões."
Em Apontamentos e Recortes sobre Football Association há ainda espaço dedicado a "Treino e seu excesso", "Público que ocorre aos campos de futebol", "Juiz e o público", "Condições para ser juiz", terminando com as leis do futebol e um glossário de termos em inglês e respetiva tradução.
Escreve, a determinada altura, que "grande parte do público tem um conceito completamente erróneo do jogo e é incapaz de apreciar se a decisão do juiz é acertada ou não". Acusa-o de ir ao campo, "não para ver jogar o futebol, porque o não sabe apreciar devidamente, mas só para ver ganhar o grupo da sua predileção". Critica-o por "nunca ter um aplauso ou um estímulo para o grupo adverso" e, "ao contrário, cada movimento do seu grupo é saudado com atroadores aplausos, ainda mesmo que só deem pontapés sem tom nem som". Lamenta que certa parte do público "mais aplauda pontapés muito altos" e que "todos os aplausos sejam para o jogador que marca a bola, pois na maioria dos casos não é ao que a fez que corresponde o mérito".
Cosme Damião procurou, com a publicação deste livro, disseminar, entre jogadores e espectadores, os conhecimentos adquiridos ao longo de 20 anos ligado ao futebol, tendo por propósito assumido a contribuição para o desenvolvimento da modalidade no país. E através da sua leitura podemos, hoje, compreender melhor como era o futebol do seu tempo.
Artigo publicado na edição de 19 de abril do jornal O Benfica
Texto: João Tomaz
Fotos: SL Benfica
Última atualização: 23 de abril de 2024